quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Pequena pérola perdida

Hoje a alquimia do meu amor
Transformou em chumbo meu coração
Desfaleço, não caminho
Sob o peso da transformação

domingo, 16 de dezembro de 2012

Do que me corrói, e do que protejo de ser corroído

Dissidência

Eu odeio o ícone!

Isso mesmo, o ícone

Esse avô lendo um jornal fedido ao som de Bach

Só pelo ato de se ler um jornal fedido ouvindo Bach

Que usa suspensórios, porque não há o 'não-usar-suspensórios'

Nem pode haver


Eu odeio o ícone!

Esse mesmo, que você odeia

Mas odeia porque lhe parece devido odiar

Olhe para trás, e me diga onde o ícone

Como medalha de soldado

Mais espetou do que honrou

Odeia porque odiar o ícone é confortável

Mas é confortável porque é ícone

Velho culto!

Você é ícone!

E eu te odeio

Porque você me machuca

E por nada mais

E te amo quando me afaga

Te odeio se me apedreja

Não te beijo se me escarra

Te machuco? Me despreza?

Mas me despreza porque te machuco?

Não passou a dor? O que ficou?

Só um velho lendo jornal de suspensórios

Não porque machuca, mas porque machucou

Não digo, me perdoasse

Não digo, me entendesse

Digo que fique com quem lhe faz bem

Porque fazer bem é bom

E se faz mal

Espera o mal passar

E volta com um escudo

Não com uma espada

Que o velho agora bate em seus netos

Porque está sozinho

E eu, como o ícone, no outro canto

Por inveja, só me deixou

Novamente com aquela saudade de saudade

Icônica, para dizer muito

A linha do ícone

Só não parece arbitrária

Porque é fixa

Mas é móvel, e arbitrária

É só viscosa, e mãe do sentido

Enquanto minhas pernas doem

E como explicar que não é o andar

São os suspensórios

Cheiro mal, não é o banho

É o jornal

Fico surdo, não é Beethoven

É Bach

Eu odeio o ícone!

Porque o ícone me machuca

E o ícone me odeia

Sem porque, porque porque o machuca

Odeia todos, porque, para ele, amar é uma conjectura

Mas se sentir confortável... Ah! O conforto!

Tão longe do irmão, o confronto!

Conforto é o nome pútrido da metaestabilidade

Um princípio cego de quietude

Usurpador da satisfação

Mãe de todos nós

O conforto é aquele menino ajustado a tapas

Brincando feliz com  uma tábua quebrada no chão

E, mais do que o avô, odeia os porquês

Porquê o machucam

Sim, odeia verdadeiramente

Mas dentro do estigma da palmatória

E, tendo um porque

Se odeia, se sofre

E se esquece, brincando com sua tábua quebrada no chão

Porque? Ele cai de costas.

Não só não há

Não pode haver

Conforto, eu conheço outro

Sobrinho daquele, filho do Confronto

Esse é um infante sorridente

No colo da avó Satisfação

Com um chocalho, que todo dia quebra

Mas nunca está quebrado

Egressos do império do Ícone

Vivem de esmolas em minha casa

E eu hei de protegê-los

Pois são meus únicos amigos

Afastai-vos, filho do Ícone

Volta com perdão ou cura à minha insanidade fulminante

Desdém não quero

Essa argamassa dos prédios de arquitetura nefasta, que o ícone ergue quando um tomba

Igual ao antigo, e certo como o que não tem porquê

Sexo sem nome
Sexo é na mente
Sexo é uma fome
Sexo é urgente

Sexo não casa
Sexo não encontra
Sexo que vaza
Sexo do contra

Sexo é carência
Sexo que mima
Sexo é demência
Sexo não rima

Sexo se esconde
Sexo é desnudo
Sexo está aonde?
Sexo está em tudo

Sexo é axioma
Sexo precisa
Sexo é idioma
Sexo urbaniza

Sexo violento
Sexo destrói
Sexo rebento
Sexo que dói

Sexo divino
Sexo é uma luz
Sexo tem tino
Sexo produz

Sexo não pede
Sexo, o puder
Sexo se cede
Sexo se quer

Sexo não sabe
Sexo o espera
Sexo que acabe
Sexo o libera

Sexo perdoa
Sexo permite
Sexo se doa
Sexo o omite

Sexo entende
Sexo não mira
Sexo não pende
Sexo se atira

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

No clima de apocalipse


Uma curiosidade: eu escrevi este poema naquele momento de fraca consciência antes de dormir. Quis escrever sobre as pragas da vida humana, e deixei 4 estrofes, para continuar mais tarde. As metáforas tem um tom vago e onírico, característico da catarse na qual eu estava. Hoje, quando abri o arquivo, percebi que as quatro estrofes eram os quatro cavaleiros do apocalipse. Quando escrevi, tenho certeza que não pensei nisso, pelo menos não conscientemente. Pensando agora, a desgraça humana mudou pouco de aspecto desde a idade média, por isso é muito natural que esses quatro temas, culminando com a morte, a mãe dos males, tenham surgido na minha crua mente naquela noite de exaustão.
Isso, ou foi uma profecia do "apocalipse maia". No dia 21 saberemos.

Quatro cavalos

Na cataclisma neurácea de Apolo
Da dobra do crepúsculo amarelo
Jaz o quartão sobre pétreo colo
Na mira fina do infecto cutelo

O pai da folha é filho da colheita
Bago picaço à solar candelária
Segurando o braço errante que deita
No fruto de um pé de poeira agrária

Nua planície a ranger aguerrida
O ouro desnudo da escrava que tenta
O cúprio escudo do fim de uma vida
No qual espana o aço ferramenta

O infinito é o fixo do olho do morto
Partindo de sua centelha de espaço
Imerso em pedra, no inverso do aborto
Para o descanso de Halicarnasso