sábado, 28 de abril de 2012

A um natimorto


Curetagem

-Pai, qual é o futuro de “mim”?
-Memória, meu filho
-Pai, qual é o gerúndio de “morrer”?
-Estou sofrendo, meu filho
-Pai, me dá um adjetivo?
-Vivo, meu filho
-Pai, o que rima com Morto?
-Ab...
-Pai, onde está “o que você amou”?
-No passado, meu filho
-Que passado?
-Imperfeito...
-Pai, qual é o presente de morrer?
-...
-Pai?
-Foi só uma interjeição
-Foi?
-É.
-Pai, qual o futuro de morrer?
-Morrer é infinitivo...
-Pai, qual é o modo de ser feliz?
-Subjuntivo, meu filho.
-E o tempo?
-Futuro.
-Futuro?
-Futuro do pretérito
-Não entendo esse
-É o futuro do sonho
-Pai, o que é silepse?
-Eu somos, meu filho
-Pai, existe um sinônimo para esperança?
-Não, ela se tem ou não...
-Pai, como se escreve “dor”?
-Lenta e fielmente, meu filho
-Pai, como se fala “descontínuo”?
-Chorando, meu filho.
-Pai, quem sou eu?
-Oximoro, meu filho
-Pai, como se soletra “você”?
-S, E, N, T, I...
-O que?
-S, E, M, T, I.
-Só?
-Completamente.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Pensamentos de solidão numa despedida bicordial.



Não há neste mundo diverso
Igualdade de maior porte
Que a que há entre a certeza da vida
E a mesma certeza da morte

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Dois animais e um conformismo

O sapo papado sapa coaxando pausado
"Quem dera, quem dera, quem dera"

Mas o grilo literato e fino lhe responde educado:
"Quem dará?"

terça-feira, 10 de abril de 2012

A Daniela Magnani, que ama o mundo com os olhos.

Magnânima

Olhar sempre apaixonado
Rosto lúcido puríssimo
Semi-sorriso elevado
De um Gautama profundíssimo

Fito-te desocultado
Numa ousada simbiose
Com teu ver apaixonado
Constante metamorfose

Ah, quem dera sem injúria
Afogar em tua pele
Overdoses de luxúria

E vazio de tão desejo
Louvar o suficiente
Esse olhar que em você vejo

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Lamento em três atos



Dança dos quereres
lamento em três atos


Despertar

Quando certa manhã
Guilherme Antonini acordou
De expectativas vazias
Encontrou-se em sua percepção
Transformado numa mentira monstruosa
Estava deitado sobre suas solidões duras como existir
E, ao levantar um pouco o ânimo
Viu a compreensão alheia abaulada
Marrom
Dividida por abstrações tortuosas
No topo do qual o bem-querer
Prestes a desistir de vez
Ainda mal se sustinha
Suas numerosas idéias
Lastimavelmente vagas
Em comparação com o resto do mundo
Tremulavam desamparadas
Diante de seus olhos


Bicardíaca

Que perna faz uma dançarina?
Que pétala faz uma flor?
Que pedra faz uma mina?
Que coração faz um amor?

Amor não se tem
Amor de certo não se é
Amor, por pouco dizer, se são
Dois amores em dois irmãos cardiossimbióticos
Um por um dois corações arrítmicos, caóticos
Unos, sincrônicos em toda dimensão
Um deles por certo é a fé
O outro, estar-sem

Com cada um em um pé
Por ti sinto amores mátrios
A Deusa de minha fé
Distante de quatro átrios


O lago dos cisnes

Pirouette, ronde de jambe, tendu, plié
Ziguezagueia, à terre e en l'air
Quebra o violino, volta o Relevé
Está delegado o papel de seu pair

Passo e volta
Viver sem
Passa e volta
Solta e tem

Às duras luzes de um balé russo
O cisne negro do ter me seduz
Tu, fé, se perde, belo cisne ruço
E não volta nem com outro cristo em cruz


Estar-sem
Marca os passos
Fé que se tem
Sem fracassos


Às puras luzes de um balé franco
Luzes que luzem em rubra coleur
Puros amores beijam sangue branco
É Sang du coeur, é sang deux coeur...











terça-feira, 3 de abril de 2012

Segredo

Escuro
Não-dito
Todo contextos
Retalhados
Encontram-se na
Linha curva e
Invisibilóide
Nua de luz
Humanamente
Anótica, única que
Significa algo